05:55. O primeiro alarme toca. Tateio e clico no botão de soneca. O horário oficial é às 06:00, mas o relógio precisa tocar cinco minutos antes, como quem diz: “vai aquecendo o motor, que saíremos em cinco minutos”.
Até às 7:00, eu respondo por meio de grunhidos entre “sim”, “não”, “bom dia” e “obrigado”, porque, apesar de não gostar de falar assim que acordo, ninguém merece o meu mau humor. Pego a condução — cheia de gente suada, fedida, com cheiro de roupa mal seca e desespero. Me pergunto se isso algum dia vai mudar e o que mais depende de mim. Afinal, eu estou dando o meu melhor. O meu melhor, na minha pior fase — que, entre nós, dura desde que eu me entendo por gente.
Subo os oito andares porque o elevador quebrou ou, pelas minhas contas, não houve sequer manutenção desde o último defeito. E eu perdi uma hora de almoço porque fui eu quem ficou preso, enquanto os técnicos estavam no almoço deles — e só vieram depois de terminar. “Bom dia, bom dia, bom dia”, repito três vezes até chegar à minha baía, como quem joga um “bom dia” no curral.
Tereza me chama para um café. Nem é quarta-feira e eu estou cansado dessa friendzone de merda de só tomar café na copa e rir, brevemente e com culpa, da nova peruca da Vilma. Mas que culpa tem Tereza, se eu nunca dei um sinal de que quero encostar minha boca na dela? Não é como se a minha cara ridícula e cansada fosse bonita. Ou que um piscar de olhos exaustos atraísse alguém do sexo feminino.
Três cafés depois, e estamos em uma reunião super excitante de metas esdrúxulas a serem batidas. Quem mapeia as metas é responsável por dizê-las — e nós, meros remadores de um navio, temos que dar conta de batê-las. Afinal, somos o melhor time que ela conhece. Talvez os únicos loucos a toparem uma empreitada dessas. “Vamos, vocês conseguem, time”, a chefe diz, tentando nos animar depois de ver a nossa disposição.
Metade do dia se foi e eu consigo respirar aliviado. Porra, eu não deveria me sentir assim. Sei que esse é só mais um dia da minha vida — mas ainda assim é a minha vida, e eu não deveria tratar os dias como se fossem quaisquer. Quer dizer... se eu for nesse ritmo, vou me tornar um filho de Camus.
A minha dose de dopamina aumentou consideravelmente quando vi que tinha feito bem mais do que precisava. E ainda era só segunda-feira. Me deu vontade de abrir uma cerveja. Mas ainda era só segunda-feira.
Os cinco minutos finais do trabalho não contam. Eu e metade da população brasileira começamos a sentir um comichão. Os dedos ficam lentos, paralisam, a mente vai desligando como um computador com Windows 2000, tossindo memória pela ventoinha. Olho para Vilma. Ela devolve o olhar com desdém — coisa do tipo: “por que você está se arrumando, se ainda faltam cinco minutos?”. Abro o e-mail e aperto F5. Aperto repetidamente. Abro o rascunho, digito: “quer ir comigo àquela exposição que falei hoje mais cedo?”, e seleciono o e-mail da Tereza.
O cursor do mouse vai até o botão de enviar. Balanço o mouse como quem ensaia um crime. Como quem acaricia uma ideia maluca, mas bem plausível.
Bip. O barulho de alguém batendo o ponto me tira do devaneio. Aperto F5.
“Hey, vamos àquela exposição que você comentou hoje mais cedo?”, leio o email de Tereza.
Ainda é segunda-feira.
Mas é como se fosse sexta-feira.
Às 17:59.
E o mundo respirasse antes de explodir.